16.8.13

Obrigado, desconhecido.

Se eu tivesse lido o meu horóscopo ontem, certamente haveria um aviso: Os astros estão em posição desfavorável em todos os aspectos. Não saia de casa, desmarque seus compromissos.
O Iphone me desperta às 7:30 ao som de grilos. O dia amanheceu gelado. Garoava. Eu tinha nada menos que 3 compromissos, a começar pela consulta com o oftalmologista às 8h, para logo depois ter minha rotineira e agradável sessão de terapia e terminar a manhã sendo espetado pelas agulhas certeiras do acupunturista Dr. Liu, que está operando milagres em minha coluna.
O endereço do oftalmo já está cadastrado no meu Iphone desde o ano passado. Com um clique no endereço, o aplicativo de mapas aparece e me indica o caminho a seguir. Tudo parece fácil, até agora. Eu ainda não saí da cama.
Ao sair de casa,  tiro os óculos, ponho o capacete, ponho o Iphone no bolso, ligo a moto mas não consigo vestir as luvas, engruvinhadas por dentro. É  primeiro sinal de que o dia seria daqueles. Desligo a moto, tiro as luvas, tiro o capacete, tiro os óculos do bolso, visto os óculos, demoro horas arrumando as luvas. Perco a paciência, já estou atrasado, enfio os dedos de qualquer jeito. tiro os óculos mas quase não acerto o bolso por causa das luvas. O capacete também é impossível de se fechar com luvas tortas. No caminho, sinais fecham, cachorros perseguem minha moto. Caminhões espirram água suja, o dedo mínimo que ainda não entrou na luva dói com a força de puxar a embreagem. O mundo conspira mas eu não percebo.
Vou seguindo as instruções do GPS do Iphone. A cada vira pra lá, vira pra cá, eu paro a moto, tiro a luva, tiro o capacete, tiro o óculos do bolso, ponho o óculos, levanto um pouco para tirar o Iphone do bolso, consulto o mapa, tiro os óculos, ponho o capacete, ponho o Iphone no bolso, ponho a luva, ligo a moto, continuo.
Cheguei. Não vejo o consultório.Tiro a luva, tiro o capacete, tiro o óculos do bolso, ponho o óculos, levanto um pouco para tirar o Iphone do bolso. Não acho placas de rua com o nome da rua que procuro. Pergunto para uma senhora com cara de moradora. Ela me diz sorrindo que a rua que eu procuro é do outro lado da cidade. Eu agradeço e sigo na direção que ela indicou, pensando "mulher maluca, sem noção, o GPS tá indicando que é aqui, vou perguntar de novo ali adiante". Tiro os óculos, ponho o capacete, ponho o Iphone no bolso, ponho a luva, ligo a moto. Dou mais uma volta procurando alguém mais confiável para perguntar.
O telefone toca. Paro a moto, tiro a luva, levanto um pouco para tirar o Iphone do bolso, ligo o alto falante do Iphone e grito, ainda de capacete - Alô, espera um pouco! -  Tiro o capacete, tiro o óculos do bolso, ponho o óculos, atendo ao telefone:
- É o Eduardo? - uma voz de garoto.
- Sim, quem é?
- Você perdeu sua carteira?
- Heim?
- Você perdeu sua carteira?
- Eu? não... peraí... (apalpadas nervosas com a outra mão esquerda por todos os bolsos)
- Você perdeu a sua carteira!
- Eu perdi minha carteira! você achou!
- Sim, aqui no centro de Mogi. Só que agora eu estou indo pra casa de uns parentes em Brás Cubas. Na hora do almoço eu volto. Te ligo mais tarde!
- Fazer o que né? ok, aguardo, obrigado!
Numa dessas vezes em que parei a moto para conferir o GPS, a maldita carteira escapou do bolso.

Foi ai que caiu a ficha. O dia era daqueles.
A segunda ficha caiu em seguida: O GPS estava me indicando o lugar errado mesmo. Uma letra errada no endereço do consultório o levou a indicar um endereço totalmente diferente, em vez de simplesmente dizer "não encontrado".

Perdi a consulta, que já foi remarcada para daqui há 2 meses. Andei e parei a moto, tirei as luvas, capacete, os óculos do bolso para o rosto e vice-versa mais duzentas vezes. Passei a manhã toda grilado com a minha carteira perdida, mas o desconhecido que a achou foi honesto e pontual. Na hora marcada, me ligou, marcou um ponto de encontro e lá me devolveu a carteira, intacta.

Não era um garoto. Era um homem adulto, só que pequeno e de voz imatura. Parecia tímido e humilde, quis me entregar a carteira e sair sem trocar muitas palavras. Se desculpou por abrir a minha carteira para procurar o meu telefone.

Na carteira havia apenas uma nota de R$10. Ofereci a ele em agradecimento. Ele recusou, agradeceu e começou a ir embora. Eu o puxei pelo braço, coloquei a nota na mão dele e falei, é simbólico, cara, 10 merréis não pagam uma cerveja! Ele entendeu, sorriu, pegou e se foi.

O dia continuou complicado até o fim. Mas eu fui dormir feliz.

17.4.13

Timelapses interativos de animações de fractais em três dimensões

Lindo o título deste artigo, não? Parece titulo de tese de pós-doutorado.

O que é um Timelapse quase todo mundo já sabe. Quem ainda não sabe do que se trata, pode pesquisar no youtube os milhares de vídeos criados com essa técnica ou assistir com atenção às novelas e programas televisivos atuais - está na moda usar timelapses para ilustrar transições de cenas, passagens de tempo, poentes, panoramas noturnos, etc.

Resolvi criar alguns timelapses para testar o meu equipamento fotográfico e avaliar alguns softwares - editores de vídeo convencionais e outros programas específicos para esse tipo de produção.


Como vocês podem ver neste timelapse acima, a coisa não é fácil. É necessário muito estudo e treino para aperfeiçoar a tecnologia. Persistência, método e paciência para fotografar e processar milhares de fotos. E, principalmente, muito fairlplay para quando tudo conspira para dar errado.

Uma das ferramentas interessantes que eu descobri permite a criação de timelapses a partir de gigafotos. O Gigapan Time Machine (GTM) é um projeto Carnegie Mellon University, a mesma que criou o Gigapan Epic Pro que eu uso profissionalmente. O aplicativo gerado pelo GTM se parece com um player de vídeo convencional, com o acréscimo de uma ferramenta de zoom que permite a aproximação da cena. Assim podemos observar detalhes que passariam desapercebidos se não pudéssemos ampliar a imagem.

Existem dezenas de aplicações interessantes para essa tecnologia. O site do GTM está repleto delas. A mais bonita que eu fiz, até o momento, foi da transição do dia para a noite vista do telhado de minha casa, vista abaixo:



Aqui no blog, alguns comandos ficam escondidos. Melhor é acessar o Timelapse diretamente AQUI

Pensando mais adiante, resolvi criar alguns timelapses com imagens criadas em computador, em vez de usar cenas reais. Fractais, como já expliquei em outros artigos, são representações gráficas de equações matemáticas complexas. Os desenhos gerados costumam ser extremamente detalhados e com nuances de cores que se perdem quando vistos em uma tela pequena. Muitos dos programas dedicados a criar fractais geram projeções em 3D que precisam ser vistas em diferentes ângulos para uma melhor percepção da sua forma.

A animação abaixo foi feita a partir de imagens geradas no Incendia - um programa de fractais 3D de última geração. Muito bonita, mas carece de interatividade. Seria muito melhor se o usuário tivesse o controle que temos no software gerador da imagem, que nos permite estudar o objeto de perto.



O Gigapan Time Machine é a solução que eu procuro para um velho problema - como conseguir a aproximação (zoom) em animações de fractais 3D. Se ele funciona bem com fotos, por que não funcionaria com imagens geradas por computador?

Mas não funcionou. Estranhamente, o programa recusava as 512 imagens que eu gerei do "Spirulacticus"* girando em torno do seu eixo. Demorei 2 semanas até que chegou o insight da solução: o GTM procura montar o timelapse de acordo com a data e hora informados nos metadados EXIF das fotografias digitais! Imagens computer-generated não contém essas informações, por isso o programa as ignorava.

Resolvido esse último problema com uma simples gambiarra, que transfere a data registrada na criação do arquivo para os metadados EXIF (Date Taken) que o GTM utiliza... consegui produzir o timelapse interativo abaixo. Espero que gostem. Vejam abaixo ou cliquem aqui para abrir em outra janela.




* faltou explicar o nome Spirulacticus: Pense no conteúdo de uma lata de leite condensado jogado no espaço sideral, sem gravidade, de forma que o liquido viscoso saia da lata desenhando formas simétricas.

3.4.13

Correios e Telegráfos

Há mais ou menos 350 anos, conforme conta o blog dos Correios, o bandeirante Agostinho Barbalho foi nomeado o Correio-Mor do Brasil.  Naquele tempo, escrevia-se com penas de aves, os envelopes eram fechados a lacre e você levava sua correspondência até o escritório dos correios de diligência. Vamos imaginar o que acontecia:

Chegando no escritório dos Correios, você entrava em uma fila enorme, gentilmente cedia seu lugar para 3 grávidas e 2 velhinhas e depois de meia hora de agradável conversa na fila de espera, chegava ao guichê.

No guichê, a moça oferecia alguns serviços extras, pesava a sua carta e calculava o preço da remessa.

Depois que você pagava, você e a moça do guichê iniciavam a escolha dos selos que seriam colados no envelope. Naquele tempo a filatelia era comum e você aproveitava para comprar alguns selos para seus filhos. Alguns selos se perdiam na hora de destacar e você gentilmente cedia a língua para umedecer a goma do verso, que tinha um gosto horrível. Por fim, a moça carimbava a imagem da coroa portuguesa em cada selo colado. Este procedimento durava, em média, 15 minutos.

Hoje em dia, existe o correio eletrônico, nosso tão popular e-mail, que a gente usa sem sair da cadeira. Mas e-mail só serve para trocar idéias. Em vez das penas, usamos impressoras. Mas continuamos a ter que ir ao correio enviar papéis.

Chegando no escritório dos Correios, você entra em uma fila enorme, é obrigado a ceder seu lugar para 2 grávidas e 8 velhinhas. Esse tempo você usa para acessar a internet com o seu celular e esculachar os correios no Facebook, Twitter e no Fourquare. Depois de meia hora de espera morrendo de calor e com um monte de gente reclamando, chega ao guichê.

No guichê, a moça oferece serviços extras, opções e outras coisas e, depois de examinar, medir e pesar a sua carta com o auxilio 1 computador, 1 fita métrica, 1 balança digital e um leitor de código de barras, calcula a raiz quadrada do cosseno da hipotenusa do envelope para chegar ao preço da remessa.

Depois que você paga, a moça do guichê inicia a escolha dos selos que serão colados no envelope. Os selos hoje em dia são super-modernos, com picote feito a laser e já vem pré-lambidos. Mesmo assim, ainda exigem cálculo mental rápido, perícia e delicadeza no manuseio, o que não era o caso da atendente de hoje, que teve que usar uma calculadora eletrônica para saber quantos selos deveria colar. Por fim, uma carimbada com o logo dos correios para cada selo colado. Portanto, acabou demorando os mesmo tempo de 350 anos atrás.

Mundo louco esse, né?